O que esperar de 2020, depois de um ano em que as fortes valorizações de todos os mercados financeiros surpreenderam a maioria dos investidores?
Contexto macro resiliente e equilibrado a nível global, baixas taxas de juros e atenuação de riscos geopolíticos importantes sustentam mercados acionistas
Desempenho dos mercados financeiros
Sumário executivo
- Os mercados acionistas tiveram um desempenho muito positivo nos mercados desenvolvidos, com destaque para as valorizações de quase 30% nos EUA e na Zona Euro, e com volatilidade muito baixa. Os mercados obrigacionistas também tiveram um desempenho positivo neste período, embora com valorizações menos expressivas, entre 10% a 20%. As matérias-primas tiveram uma valorização de 5% e o dólar apreciou-se 2% face ao euro.
- Os fatores que mais contribuíram para esse desempenho foram a inflexão da política monetária americana, a diminuição de alguns dos principais riscos geopolíticos (guerra comercial e Brexit desordenado) e um contexto macroeconómico razoável, mas equilibrado nas suas várias dimensões.
- Os principais indicadores macroeconómicos, incluindo os indicadores avançados, estabilizaram a níveis razoáveis, perspetivando-se taxas de crescimento do PIB global aos níveis do produto potencial, com ritmo moderado nas economias avançadas e maior dinamismo nos mercados emergentes, e inflação estável nas principais geografias.
- As políticas monetárias estão expansionistas em quase todo o mundo, com taxas de juro dos bancos centrais negativas na Europa e Japão e em baixa nos EUA, e as políticas fiscais estão expansionistas na Europa central e na China.
- As margens operacionais das empresas e a confiança dos consumidores, são a exceção, mantendo-se a nível elevado.
- Os resultados das empresas mantiveram-se, a um nível alto, perspetivando-se crescimentos anuais entre 5% e 10% nas economias avançadas (a época de resultados de janeiro em curso pode permitir melhorar esta previsão).
- Houve expansão dos múltiplos dos mercados acionistas que agora estão ligeiramente acima da média histórica nos EUA, e abaixo desta média na Europa e sobretudo no Japão e nos mercados emergentes.
- As taxas de juro estão a níveis muitíssimo baixos em todos os prazos com mais de $11 biliões de obrigações a taxas negativas ou cerca de ¼ do mercado total e ½ do mercado excluindo os EUA.
- Os mercados obrigacionistas estão genericamente caros, com taxas de referências negativas na maioria dos países europeus desenvolvidos e Japão, e spreads de crédito próximos de mínimos históricos.
- O sentimento da generalidade dos investidores favorece o investimento em mercados acionistas relativamente aos mercados obrigacionistas, pela procura de rendibilidade mínima pelos mais conservadores e pelo medo de perder boas rendibilidades pelos mais agressivos.
- Após a desaceleração do PIB real mundial de 3,6% em 2018 para 2,9% em 2019, perspetiva-se uma retoma para níveis de 3,3% em 2020, suportada num consumo resiliente, mantendo-se o crescimento acima dos níveis média de longo prazo e do nível do produto potencial.
- Os riscos geopolíticos atenuaram-se com a assinatura da fase 1 do acordo comercial entre a China e os EUA e a vitória eleitoral e programa de governo de Boris Johnson no Reino Unido relativamente ao Brexit, se bem que se mantenham os protestos em Hong Kong e haja um aumento das tensões no Golfo Pérsico.
- Este cenário favorece a manutenção da alocação central definida às diferentes subclasses de ativos dos mercados financeiros, com alguma sobre ponderação das ações relativamente às obrigações, e uma alocação preferencial aos mercados acionistas dos EUA e da Europa.
Desempenho dos mercados financeiros 2019
Em 2019, todos os segmentos de mercados acionistas e obrigacionistas sem exceção tiveram excelentes desempenhos, dos melhores das últimas quatro décadas, contrariando o ocorrido em 2018 e sobretudo no culminar desse ano.
Pela primeira vez desde há muitos anos deixou de se ouvir falar de graves ameaças de inflação ou deflação, desequilíbrios externos ou orçamentais ou até falências de países, nas principais economias ou regiões mundiais.
Contexto macroeconómico: Crescimento a nível baixo, mas a níveis acima do potencial e com maior dinamismo nos países emergentes, e sem pressões inflacionistas nas economias desenvolvidas
- O crescimento do PIB em termos reais caiu para 2,9% em 2019, prevendo-se uma retoma para 3,3% em 2020, praticamente ao nível da média de 3,5% de longo prazo em 2020 e em linha com o produto potencial, com uma estabilização do crescimento nos mercados desenvolvidos e maior dinamismo nos países emergentes, em particular na China.
- A taxa de inflação tem estado estável em quase todas as principais geografias, em torno dos 2% nos EUA, 1% na zona Euro e 0,5% no Japão.
- As maiores economias avançadas registam níveis historicamente baixos de desemprego.
- Os EUA e China assinaram em janeiro de 2020 a fase 1 de um acordo comercial, com a eliminação de algumas tarifas sobre bens.
Contexto macroeconómico: Políticas monetárias expansionistas nas maiores economias, com redução das taxas de juro pelos bancos centrais
- Os principais bancos centrais estão a desenvolver políticas monetárias expansionistas, inclusive a FED dos EUA que reverteu o ciclo de aumento das taxas de juro dos últimos 2 anos, fez três cortes das taxas de juros e tem um programa de compras de ativos mensais de $60 mil milhões até pelo menos ao fim do primeiro semestre deste ano com vista estabilizar o mercado monetário de curto prazo.
- As taxas de juro de curto prazo estão negativas na Zona Euro, Japão e Suíça, e em descida nos EUA.
- As taxas de juros dos títulos do tesouro a 10 anos estão próximas de zero na Zona Euro, Japão e Suíça, e em descida nos EUA e RU.
- Prevê-se que as taxas de juros de referência dos bancos centrais se irão manter negativas na zona Euro por um período prolongado e que poderá ir até 2024/2025, e que as dos EUA se mantenham abaixo dos 2%.
Contexto macroeconómico: Política orçamental neutra e limitada nas maiores economias, e atenuação dos riscos políticos nos EUA e Europa
- A política orçamental tem estado praticamente neutra nos últimos anos e os países têm pouca margem de manobra ao nível do déficit público (com exceção da Alemanha e Holanda).
- O impacte da política fiscal no estímulo do crescimento económico tem sido limitado.
- As condições financeiras globais têm sido bastante acomodatícias nos EUA e Zona Euro e neutras na China e nas restantes economias avançadas.
- Os riscos geopolíticos diminuíram com a assinatura da fase 1 do acordo comercial entre EUA e China e a vitória eleitoral e programa de governo de Boris Johnson no Reino Unido relativamente ao Brexit, embora se mantenham os movimentos de protesto em Hong Kong e haja maior tensão no Médio Oriente.
Contexto microeconómico: Estabilização dos indicadores avançados, mas manutenção de margens operacionais e níveis de confiança a níveis elevados
- Os indicadores avançados de crescimento económico (mais recentes e reportados a janeiro), em particular o inquérito à indústria (que normalmente tem um desempenho alinhado com o do índice de mercado MSCI World), pararam de deteriorar-se nos últimos meses.
- As margens das empresas mantêm-se a um nível muito elevado.
- Os indicadores de confiança dos empresários e consumidores mantêm-se também altos.
Avaliação dos mercados: Mercados acionistas em níveis justos, mas com revisões de previsões de diminuição de crescimento dos EPS
- A avaliação do mercado acionista global está praticamente em linha com a média de longo prazo, mas com diferenças ao nível dos principais mercados. O PER de 18.7x para os EUA está acima da média, o de 14.4x na Zona Euro e no Japão bastante abaixo da média e o de 12.7x nos mercados emergentes em linha com a média. As avaliações relativas entre EUA e o Resto do Mundo estão num nível de desfasamento extremo.
- Preveem-se taxas de crescimento dos resultados de 9,8% para o mercado acionista global em 2020, o que contrasta com o crescimento nulo de 2019 após sucessivas revisões em baixa do mesmo nível de partida, comportamento semelhante ao verificado em anos anteriores com exceção dos anos de 2017 e 2018.
Avaliação dos mercados: Mercados obrigacionistas caros, com taxas de juro negativas na Europa e Japão, e spreads de crédito próximos de mínimos
- Cerca de $11 biliões de obrigações estão com rendibilidades implícitas negativas, sobretudo na Europa e Japão, representando pouco menos de 1/4 do mercado mundial e quase 50% do mercado ex-EUA, em resultado da fixação de taxas de juro negativas pelos bancos centrais e dos programas de compras de ativos.
- Os spreads de crédito estão a níveis muito baixos em termos históricos em todo o mundo desenvolvido.
- Este quadro reflete fundamentalmente a atuação da política monetária dos bancos centrais, mas também as políticas de investimentos dos principais investidores institucionais (fundos de pensões, seguradoras, bancos e muitos fundos de investimento), e alguns receios de recessão económica que se têm vindo a desanuviar nos últimos tempos.
Principais oportunidades
- Crescimento económico global para níveis previstos 3,3% em 2020, próximos da média de longo prazo e em torno do seu nível potencial, sem desequilíbrios acentuados em termos de contas externas e do setor público nas maiores economias, assente num consumo robusto.
- Baixas taxas de juros em todas as economias avançadas que são positivas para empresas e consumidores (menos custos financeiros) e fomentam os investidores acionistas (procura de rendibilidade e custo de oportunidade).
- Boa capacidade financeira dos consumidores devido às baixas taxas de juro, baixos níveis de desemprego, baixas taxas de inflação e aumento da riqueza patrimonial.
- Indicadores de avaliação a níveis razoáveis para o contexto macro de baixo risco a nível global, e de baixas taxas de juro nos países desenvolvidos.
Principais riscos
- Riscos geopolíticos associados aos protestos em Hong Kong/China, tensões no Médio Oriente (Irão, Iraque e Arábia Saudita) e à governação nos EUA (eventual impeachment de Trump e eleições em novembro).
- Crescimento inferior ao esperado sobretudo nos países emergentes, em particular na China e India.