O efeito do ROIC nas avaliações pelos múltiplos de PER e PEG
O ROIC dos vários setores de atividade
Os drivers do ROIC
Como obter o ROIC, o custo do capital e outros indicadores fundamentais das empresas?
Este artigo faz parte de uma série sobre o investimento em ações.
No primeiro artigo da série, apresentámos as razões para o investimento em ações individuais.
Vimos também como é que podemos usar uma estratégia de “core” e satélite na gestão do nosso património, combinando investimentos indexados a mercados e de baixo custo com investimentos em ações individuais.
No segundo, abordámos o tema de como podemos selecionar o universo de ações para chegarmos à nossa lista de ações em que investir.
Relacionámos o objetivo desta lista com as listas das ações que tiverem um excelente desempenho no passado.
Também vimos que embora haja muitas listas disponibilizadas publicamente pelos media especializados só há uma lista que se adapta ao nosso caso individual.
A seguir passámos para os princípios de análise e avaliação das ações que farão parte da nossa lista.
Num artigo posterior, analisámos a importância de investirmos em ações com vantagens competitivas duradouras ou sustentáveis e quais as metodologias de análise para as identificarmos.
Mas, tão importante como o valor destas empresas com vantagens competitivas, é o preço da compra.
No artigo subsequente abordámos os vários métodos de avaliação – análise fundamental, técnica e quantitativa – de forma a concluirmos se uma ação está a um preço razoável e justo ou se está demasiado cara.
No âmbito da análise fundamental vimos os modelos de fluxos de sendo caixa descontados e a sua versão simplificada, o modelo de Gordon, como sendo a maneira mais sensata de determinar o valor de um negócio.
Na primeira parte deste artigo, focámos a importância do ROIC – o retorno sobre o capital investido (“Return On Invested Capital”) – nos modelos de avaliação fundamental e na determinação do lucro de uma empresa que está disponível para ser distribuído aos acionistas.
Vimos também a relação do ROIC com outras variáveis financeiras do modelo, o crescimento e a distribuição de resultados, pusemos em evidência o ROIC como a métrica chave do valor fundamental da ação, e analisámos a sua relação com os vários modelos anteriores,
Nesta segunda parte analisamos a utilização do ROIC na prática da avaliação, e a sua relação com os dois principais múltiplos do mercado, o PER e o PEG.
O efeito do ROIC nas avaliações pelos múltiplos de PER e PEG
Na última linha da tabela, a empresa não procura crescer os resultados, não sendo necessário reinvestimento, e a taxa de distribuição mantém-se constante (em 100%) à medida que se avança da esquerda para a direita.
Nas linhas em que a taxa de crescimento é maior do que zero, quando se aumenta o spread do ROIC sobre o custo de capital (da esquerda para a direita, por linha), o valor da empresa e o PER associado, aumentam.
Isso ocorre porque, à medida que o ROIC aumenta, a taxa de reinvestimento necessária para alcançar uma determinada taxa de crescimento diminui e a taxa de distribuição aumenta (ou seja, D mais alto no numerador).
Este é um ponto chave que muitos investidores não percebem.
O facto de duas empresas terem a mesma taxa de crescimento não significa que devam transacionar ao mesmo múltiplo de PER. Um ROIC mais alto é sempre melhor do que um ROIC mais baixo, para empresas com a mesma taxa de crescimento.
Se o ROIC se mantiver constante e a taxa de crescimento variar (de cima para baixo, por coluna), os resultados variam, e o principal critério distintivo é se o spread do ROIC sobre o custo de capital é positivo, negativo ou zero.
Quando o spread ROIC é positivo, o maior crescimento aumenta o valor do negócio e, portanto, o PER, e à medida que o spread ROIC aumenta, o PER torna-se mais sensível a mudanças no g.
Quando o spread de ROIC é negativo (a coluna à esquerda), crescer mais rápido reduz o valor do negócio, levando a rácios de PER mais baixos à medida que o crescimento aumenta.
A conclusão mais importante é que os rácios de PER, por si só, não nos dizem se uma empresa é mais barata do que outra.
A gama de resultados é ampla, com valores de PER entre de 3,9 a 39,3. Uma ação negociada a 20 vezes os lucros pode estar tão corretamente apreçada quanto uma ação negociada a 10 vezes.
Há muitos investidores que pensam que este problema se resolve olhando não apenas para o rácio PER simples, mas também para o rácio PER de uma empresa em relação à sua taxa de crescimento, ou sja, o rácio PEG.
Os rácios PEG têm completamente uma base lógica. As taxas de crescimento mais altas diminuem o denominador na equação do modelo de crescimento de Gordon e, portanto, parecem aumentar o valor do preço (P), o que também significa uma maior rácio de PER.
A tabela seguinte confirma esta intuição, mostrando o valor justo do PEG, pela divisão do rácio de PER pela taxa de crescimento de resultados:
Há uma grande variação no PEG, entre 0,5 e 11,2, pelo que claramente, não existe uma “boa” relação PEG em sentido absoluto.
Além disso, é evidente que não existe, de facto, uma relação linear entre os rácios PEG e o crescimento, o pressuposto implícito subjacente à utilização dos rácios PEG de alguns investidores.
Ou seja, o facto de uma empresa negociar a um rácio PEG de 4 enquanto outra negoceia a um rácio PEG de 2, por si só, não nos diz nada sobre qual a empresa que tem um preço mais atrativo.
Os fluxos livres de caixa e o crescimento futuro determinam conjuntamente o valor de um negócio, mas há um “trade-off” inerente entre os dois, e a variável que, em última análise, triangula o resultado desse “trade-off” é o ROIC.
Resumindo, os rácios PER e PEG são métricas completamente inadequados e enganosos, se não se incorporar o ROIC na análise.
Não existe um padrão absoluto para dizer se um dado rácio PER ou PEG é “barato” ou “caro” e, mesmo numa base relativa, uma empresa com um rácio PER ou PEG mais baixo não é necessariamente mais barata do que uma empresa com rácios mais elevados.
O valor justo de uma empresa no modelo de Gordon depende de três coisas, os fluxos de caixa para os acionistas (que é uma função do ROIC da empresa), a taxa de crescimento, e o retorno que os investidores exigem para investir na empresa.
E porque estas três variáveis influenciam o preço, também influenciam o rácio PER.
Nesta medida, quando os investidores procuram calcular o alor justo de uma empresa, devem procurar analisar até que ponto o ROIC, o crescimento e o retorno estão refletidos no preço.
O ROIC dos vários setores de atividade
O ROIC varia consoante os setores de atividade:
Na tabela seguinte podemos analisar as relações entre o ROIC, o crescimento do EPS, as rentabilidades anualizadas e os PER, a nível setorial, relativamente ao S&P 500:
O setor financeiro, a energia e as matérias primas têm os ROIC mais baixos enquanto os bens de consumo, a tecnologia e a saúde os têm ROIC mais altos.
A análise útil destes valores é comparar os retornos e os PER em diferentes momentos e tentar perceber os fatores da avaliação, ROIC, crescimento e custo de capital.
Os drivers do ROIC
O gráfico seguinte mostra a distribuição das 500 maiores empresas do Russell 3000 com base nos drivers de seu ROIC:
A linha preta sólida é uma curva isoquanta que representa as combinações de margem de lucro (NOPAT) e a rotação do capital investido que equivalem a um ROIC de 5%, que é uma estimativa para o custo de capital em 2021.
As empresas do canto inferior direito, com margens relativamente elevadas e baixa rotação do capital investido, seguem uma estratégia de diferenciação.
As empresas do canto superior esquerdo, com margens relativamente baixas e elevada rotação perseguem uma estratégia de liderança de custos.
Podemos decompor ainda mais os resultados ao analisar empresas específicas.
O conceito dos fatores que impulsionam o ROIC já existe há muito tempo e é comumente chamado de análise ou formula DuPont.
Como obter o ROIC, o custo do capital e outros indicadores fundamentais das empresas?
A Universidade de Stern em NY de Damodaran mantem uma base de dados com o ROIC, o custo do capital (e as suas componentes) e o beta por setor para as empresas que compõem o índice S&P 500:
https://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/datafile/mgnroc.html
https://pages.stern.nyu.edu/~adamodar/New_Home_Page/datafile/wacc.htm
A Morningstar disponibiliza no seu site o ROIC das empresas sob as quais faz análise de research fundamental, como por exemplo a Apple: